O ato infracional é caracterizado por uma postura prevista em lei como crime ou contravenção penal. Indisciplina é concebida como atitude que compromete a convivência democrática e ordeira do ambiente escolar - portanto de responsabilidade da escola.
Os atos nas escolas que constituem crimes são vários, porém a maioria não é registrada, e vão desde a perturbação da ordem às ações de violência física. Mas, pretendo direcionar este artigo para o que considero ato infracional. Questiono: o indisciplinado multirreincidente não estaria lesando os demais colegas e professores em seus direitos de aprender e lecionar, já que são garantidos na Constituição Federal e na legislação educacional? Estariam os infratores influenciando a si mesmos e aos outros a futuros atos de transgressão como a violência? Se, afirmativo, então por que a indisciplina multirreincidente não é caracterizada como ato infracional? Por uma única razão: graças ao comportamento histórico das escolas de acreditarem que podem assumir a responsabilidade.
Numa reflexão crítica, as instituições de proteção à criança e juventude estão corretas ao garantirem com veemência os direitos educacionais dos alunos infratores, porém quando ao fazê-lo deixam de garantir o mesmo direito aos demais alunos e aos profissionais em educação. Pois o direito não se restringe em estar matriculado com frequência e ter um professor, mas no ambiente adequado com relação social de mútuo respeito para que possa existir aula com qualidade.
Esta afirmação está com base na interpretação equivocada do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que consolidou na sociedade apenas os direitos e omitiu os deveres da criança em ter limites na família, na escola e na lei.
Porém, quando a escola busca impor limites, conforme suas possibilidades - no uso da suspensão, por exemplo -, pode ser denunciada e a justiça imediatamente ordena o retorno do aluno à sala de aula. Os reflexos dessa decisão na escola reforçam no imaginário dos alunos que podem tudo, já que estão sob a proteção da lei, generalizando a indisciplina o que. Por consequência, isso pode ser o estopim para futuros atos infracionais e a violência em todas as suas formas, restando aos profissionais em educação aceitar passivamente a decisão judicial, independente do clima de desconforto que se instala no ambiente escolar.
A indisciplina multirreincidente e a violência encontram-se em um nível absurdo: primeiro porque são formas de expressão consciente ou não do descontentamento/revolta, não apenas da escola, mas do contexto de vida social, econômica e familiar; e em segundo porque as escolas, para não terem o rótulo de incompetentes, não acionam a justiça de forma incisiva, procurando resolver os problemas no âmbito interno, normalmente delegados aos professores.
Se a família é na lei coresponsável pela educação, os responsáveis pelos alunos indisciplinados multirreincidentes e infratores, por prática, não comparecem na escola ou "lavam as mãos", e novamente recai aos professores toda responsabilidade.
Portanto, cabe às escolas/professores inverterem a cultura do constrangimento e de absorverem competências que não estão em condições de exercê-las, para acionarem formalmente, denunciando ao conselho tutelar e à justiça, não apenas os casos de ato infracional, mas também os atos de indisciplina multirreincidente, para que as medidas sócioeducativas sejam aplicadas.
Pode ser uma postura "não pedagogicamente correta", mas frente à atual conjuntura educacional com certeza forçará a justiça e as instituições de proteção à criança e adolescente reverem suas decisões na mera delegação de responsabilidade à escola/professores, para passarem a exigir do Poder Público o atendimento especializado de multiprofissionais aos alunos envolvidos.
Registrar uma ocorrência não significa promover a exclusão ou um ato de violência aos alunos. Justamente o contrário. Este poderá ser o instrumento que forçará a família a responder diretamente pela educação de seu filho e pela prevenção, ante o contínuo aliciamento de grupos criminosos - uma vez que eles são alvos fáceis de cooptação -, de reduzir a violência. Para o Poder Público garantiria o atendimento à integração do aluno, que não se encontra na escola, por mais que desenvolva projetos, pois suas necessidades perpassam por outras dimensões: culturais, econômicas, familiares, psicológicas entre outras.
Os alunos indisciplinados multirreincidentes e infratores são vítimas do sistema, mas não significa que é permitido produzir outras transgressões, quando seus atos impedem o direito dos demais de terem um ambiente que propicie o pleno exercício do magistério e do aprendizado.
Fonte: Educação Pública/Sua Voz
Fonte: Educação Pública/Sua Voz
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